OESP, Vida, p. A26 - 13/11/2005
Olhos e ouvidos voltados para o céu
Com mais de 130 espécies de aves, Parque Intervales se torna ponto de atração mundial de observadores de pássaros
Mauro Mug
Assim como as aves que migram, os observadores de pássaros atravessam continentes para praticar seu hobby - o birdwatching, palavra em inglês pela qual a atividade é conhecida internacionalmente. Até pouco tempo atrás, o Brasil oferecia dois pontos "de pouso" principais para esses ornitólogos amadores, em sua grande maioria estrangeiros: a Amazônia e o Pantanal. Recentemente, a mata atlântica entrou no roteiro deles. E, desse ecossistema que se estende de norte a sul do País, uma área especialmente rica em diversidade e em quantidade de aves foi a escolhida: os 41,7 mil hectares de floresta do Parque Estadual Intervales, na região sul do Estado de São Paulo, a 270 quilômetros da capital. Ali sobrevoam pelo menos 132 espécies de pássaros.
Todo ano, 10 mil pessoas visitam o parque - a maioria turistas vindos dos Estados Unidos e dos países do norte da Europa. No fim do mês passado foi a vez de um grupo de 13 dinamarqueses. Equipados com lunetas, binóculos, gravadores e caderninhos para anotações, eles percorreram várias trilhas do parque para olhar pássaros raros.
A excursão, programada pela Sociedade Ornitológica da Dinamarca, previa visitas também à Amazônia, ao Pantanal e a Foz do Iguaçu. "Estivemos nesses lugares, mas parece que aqui a quantidade de pássaros é maior e a variedade também. Há muitos cantos pela floresta", constatou Erik Molgaard, funcionário da Scandinavian Airlines e observador de pássaros nos momentos de folga.
CAIXA DE SOM E CD
O Brasil é conhecido mundialmente pela variedade de aves que acolhe. "Publicações em revistas e livros destacam este parque" contou Molgaard. "Além disso, amigos que estiveram aqui nos falaram da beleza especial deste lugar." Durante uma caminhada matutina pela mata, Molgaard não conseguiu ver um dos pássaros mais cobiçados da região: o choca-da-taquara. "Vou ficar aqui mais dois dias e espero conseguir admirá-lo."
Carlos Eduardo de Sousa Carvalho, patologista da Universidade Federal do Rio de Janeiro, faz de tudo para não frustrar expectativas. De tempos em tempos, ele dá uma folga a seus pacientes do Hospital Miguel Couto, no Rio, e faz "um bico" como guia. Com um discman, uma pequena caixa de som e um CD com o canto de várias aves, ele atrai os pássaros para que os visitantes possam observá-los melhor. E ainda compartilha com eles sua experiência e informações colhidas em 25 anos de andanças pelas matas.
Carvalho é auxiliado pelo caboclo Luiz Avelino Ribeiro, monitor do parque e profundo conhecedor de aves. É ele que as identifica pelo nome científico. "Às vezes chega a dar um nó na língua quando digo um nome mais complicado em latim", afirma. Ele é capaz de identificar e atrair aves após ouvir gravações trazidas pelos turistas com o canto das espécies que pretendem contemplar.
Há um ano, Ribeiro atendeu três holandeses que traziam no currículo a observação de 7 mil espécies diferentes em várias parte do mundo. Faltavam 11 pássaros que não haviam encontrado em nenhum outro lugar do Brasil. "Só conseguimos localizar três: o sabiá-cica, o jacutinga-do-sudeste, que está ameaçado de extinção, e o tovacuçu-malhado. Mesmo assim, eles ficaram muito satisfeitos."
ÁREA BEM CONSERVADA
"A riqueza da avifauna é resultado do ótimo estado de conservação da mata atlântica presente no parque", explica o responsável pela administração do Intervales, o geógrafo Maurício de Alcântara Marinho. Ele fica numa região de clima ameno, chuvas bem distribuídas e relevo acidentado, com diferenças de altitude entre 40 e 1.089 metros. A cobertura vegetal predominante é a floresta pluvial tropical, com árvores de até 35 metros de altura.
O local também é refúgio de animais ameaçados de extinção, como a onça-pintada, o mono-carvoeiro e a jacutinga e de espécies endêmicas como o veado-bororó, mamífero descoberto há três anos na região.
O professor Pedro Develey, do curso de Ciências Biológicas da Universidade de São Paulo, considera o parque uma das áreas mais bem protegidas e preservadas de mata atlântica do País. "O Intervales, com o Parque do Alto Ribeira e os Parques Carlos Botelho, Jacupiranga e da Juréia formam um bloco verde com 400 mil hectares de mata atlântica preservados", disse.
Num levantamento, feito em 1987, constatou-se a existência de 132 espécies. Mas, como vários trechos da mata foram recuperados, acredita-se que esse número tenha aumentado. As mais procuradas pelos observadores são o pica-pau-de-cara-canela, o pixoxó, o bacurau-rabo-de-seda, a coruja-caburé-canela e o coloridíssimo tangará-dançarino.
Nem todos os observadores têm conhecimento profundo sobre pássaros. Numa caminhada recente, no fim de outubro, ao ouvir um canto estranho, um dinamarquês quis saber: "Que pássaro é este?" O guia respondeu: "Não é ave; são cigarras."
Reforma dará mais conforto no parque
Empréstimo do BID vai ser usado em paisagismo e criação de duas pousadas
No início do ano que vem, a Fundação Florestal porá em prática o Projeto de Revitalização do Parque Estadual Intervales. O objetivo principal é melhorar o atendimento oferecendo mais conforto aos turistas.
Além do Intervales, outros cinco parques integrarão o projeto, que custará US$ 15 milhões - US$ 9 milhões fornecidos pelo BID e R$ 6 milhões pelo governo do Estado. A aprovação do empréstimo foi assinada no fim de outubro.
As obras contemplam a construção de novas instalações para os serviços de recepção, monitoria e administração, além de duas novas pousadas, que serão chamadas de Lontra e Mono-Carvoeiro. O restaurante passará por reformas, assim como as pousadas Onça-Pintada, Pica-Pau e Esquilo.
Também está prevista a revitalização da infra-estrutura de lazer, que abrange quadra esportiva, campos de futebol, piscina de pedra e quiosques para piquenique. Toda a sede do parque mudará de cara com um novo projeto paisagístico.
As hospedagens que o parque oferece ficam dentro da própria reserva. As pousadas são rústicas, mas aconchegantes. Os quartos são simples. O conforto maior fica por conta da vista, já que as varandas são de frente para a mata. No restaurante são servidas refeições caseiras. O preço da diária é baixo e inclui pernoite, equipamentos para os passeios em cavernas e os serviços de guias.
BOTAS E IMPERMEÁVEIS
Como a região é úmida, fria e chuvosa na maior parte do ano, os visitantes são aconselhados a colocar na bagagem várias trocas de roupas, pelo menos uma capa impermeável, mais de um par de tênis e, de preferência, levar botas de borracha. As trilhas são de barro com declives e aclives acentuados. É inevitável ficar molhado ou sujo de barro e as pousadas não têm serviço de lavanderia.
Os telefones celulares não funcionam na região e a falta de luz elétrica é freqüente por causa de chuvas fortes e raios.
Os funcionários, principalmente os guias, são simpáticos e gentis. As reservas devem ser feitas pelo e-mail reservasintervales@fflorestal.sp.gov.br ou pelos telefones (0xx15) 3542-1245 ou 3542-1511.
OESP, 13/11/2005, Vida, p. A26
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